A Federação das Associações de Moradores do Estado de Santa Catarina (FAMESC) é responsável por mais de 2.500 Associações de Moradores, Conselhos Comunitários e demais entidades representativas de moradores, e ainda, das cerca de 70 Uniões de Associações de Moradores de todo o estado de Santa Catarina. A Federação promove a democracia, ética, cidadania, direitos humanos na luta por mais justiça social e pela melhoria da qualidade. Para tanto, trabalha no fortalecimento das Associações de Moradores, Conselhos Comunitários e demais entidades representativas de moradores e organizações populares, visando sempre a autonomia em relação aos governos e partidos políticos.
Além das contestações jurídicas, tem crescido as manifestações dos movimentos sociais, de entidades de classe, questionando os efeitos da ação das Organizações Sociais no serviço público. Em entrevista ao Sintespe o presidente da Federação das Associações de Moradores do Estado de Santa Catarina (Famesc) e diretor de Relações Internacionais da CONAM, Allan Rodrigo Alcântara, afirmou que na prática, os governos que optam por transferir suas responsabilidades para as OS’s têm sucateado deliberadamente os serviços e equipamentos públicos para depois entregá-los nas mãos das entidades privadas. “Transferindo recursos públicos para essas verdadeiras empresas”, explica.
Como atual presidente da Famesc, Alcântara tem participado das discussões sobre as Organizações Sociais. Durante o XII Congresso da Famesc, foi deliberado a presença da entidade no Encontro Estadual pela Revogação da Lei das OSs. Para o presidente existe a necessidade de ampliar cada vez mais a participação popular no interior dos mecanismos governamentais objetivando a efetividade da democracia.
Entrevista
Sintespe: Qual é a análise da FAMESC a respeito da transferência da gestão dos serviços públicos para as Organizações Sociais?
Allan Rodrigo Alcântara: Para uma análise mais profunda sobre as Organizações Sociais (OS’s), inicialmente temos que ter em mente que estas entidades na verdade não tem nada de público. Do nosso ponto de vista, são uma verdadeira anomalia jurídica, pois são pessoas jurídicas de direito privado, em que em tese não podem ter fins lucrativos, mas que recebem uma qualificação especial do Estado brasileiro, que é este título de OS's, para desenvolver atividades que são de responsabilidade dos poderes públicos. É importante ressaltar que esta condição especial de qualificação de entidades privadas é parte de um projeto político que dominou o cenário brasileiro durante toda a década de 1990. Um projeto baseado no ideário de desmonte do Estado, onde o mercado tem o poder de regular a vida do povo. Na prática é um instrumento a serviço desta lógica de desmonte, amparada por força da Lei 9637/98 de autoria do então Presidente da República Fernando Henrique Cardoso.
Sintespe: Como você vê a figura das OSs no país?
Allan Rodrigo Alcântara: A manutenção e ampliação dos contratos de transferência de serviços e equipamentos públicos para as OS’s, em todo território brasileiro, é hoje no mínimo uma incoerência política. Um anacronismo com o atual momento político, onde a intervenção cada vez mais forte do Estado tem provocado mudanças profundas para melhor em nossa sociedade. Somos, em 2011, um país rico, com um povo com direitos, bem diferente da situação vivida em 1998.
Sintespe: Como surge a Lei das OSs?
Allan Rodrigo Alcântara: Com a Lei 9637/98, e através dela, outras dezenas de Leis Estaduais e Municipais levaram as Organizações Sociais a todos os cantos do Brasil – até o mês de março de 2011, existiam no Brasil cerca de 300 OS’s, distribuídas em 14 estados e em cerca de 160 municípios - dando ares de legalidade a esta imoralidade que é a transferência de responsabilidade na execução dos serviços públicos através da terceirização das chamadas atividades-fim.
Allan Rodrigo Alcântara: Com a Lei 9637/98, e através dela, outras dezenas de Leis Estaduais e Municipais levaram as Organizações Sociais a todos os cantos do Brasil – até o mês de março de 2011, existiam no Brasil cerca de 300 OS’s, distribuídas em 14 estados e em cerca de 160 municípios - dando ares de legalidade a esta imoralidade que é a transferência de responsabilidade na execução dos serviços públicos através da terceirização das chamadas atividades-fim.
Sintespe: Como ficam os servidores públicos a partir da lógica de gestão das OSs?
Allan Rodrigo Alcântara: Uma questão de fundo precisa ser colocada em pauta. Qual é a lógica de um governante que precariza, por exemplo, um hospital, com a transferência deficitária de recursos para sua manutenção e pleno funcionamento, quando este ainda esta sob sua responsabilidade direta, e após transferir sua administração para uma OS, começa a destinar volume de recursos cada vez maiores para as mesmas finalidades?
Sem contar na dispensa de licitações que estas entidades recebem ao assinar o contrato de terceirização, um verdadeiro escândalo. Nem mesmo as contratações de trabalhadores têm um mínimo de exigência equivalente ao estágio anterior, quando administrado pelo Estado. Com salários menores que a média do serviço público e condições trabalhistas ainda piores, o serviço prestado a população sofre os mesmos efeitos nefastos que os trabalhadores são expostos.
A inversão de valores é uma afronta a inteligência do povo. Destina-se mais dinheiro público para prestação do mesmo serviço, e ao mesmo tempo diminui-se o custo, com manobras imorais como a precarização das relações de trabalho.
Sintespe: Qual é a situação das OSs no serviço de saúde de Santa Catarina?
Allan Rodrigo Alcântara: Mesmo condenado por uma Ação Civil Pública o Estado de Santa Catarina, caminha a cada novo dia na contramão da história. Além dos contratos de terceirização com uma OS chamada FAHECE, que transferiu a responsabilidade do Estado sobre o Centro de Hematologia e Hemoterapia (HEMOSC) e Centro de Pesquisas Oncológicas (CEPON), foram assinados após a condenação outras terceirizações.Hoje além dos contratos do HEMOSC e CEPON que custarão aos cofres públicos em 2011 mais de 72 milhões de reais, temos somente na área da saúde a terceirização de 4 Hospitais.
O Hospital Regional de Araranguá foi transferido para OS Fundação Educacional de Criciúma, que em 2011 receberá uma subvenção de 5 milhões e 120 mil reais para administrá-lo. Ao Hospital Infantil de Joinville, também terceirizado a uma OS serão transferidos 21 milhões. Já o Hospital de Xanxerê, transferido para a OS Fundação São Paulo Apóstolo receberá em 201, cerca de 248 mil reais. Mas o caso mais grave parece ser a recém terceirização do Hospital Regional de São Miguel do Oeste, que sob a administração da OS Associação Beneficente Hospitalar Peritiba, receberá no ano de 2011 quase 29 milhões de reais dos cofres públicos. Esta terceirização do Hospital Regional de São Miguel do Oeste aconteceu pouco após a inauguração da unidade, construída e equipada totalmente com recursos públicos.
Sintespe: Como a entidade vê as ações do governo Colombo ao ampliar a transferência de serviços públicos para a gestão das OS?
Allan Rodrigo Alcântara: Este modelo de desresponsabilização do Estado esta sendo apontado como a solução para as deficiências nos serviços públicos pelo atual Governador Raimundo Colombo. Além da expansão do modelo na área da saúde, o governo e o governador já anunciaram por diversas oportunidades que ampliarão este método como modelo de governança para os demais setores das políticas públicas, em especial, a área da Segurança. As lideranças comunitárias de todas as regiões e nos estado se opõem a esta idéia. Foi neste sentido que durante a realização do XII Congresso da Federação das Associações de Moradores do Estado de Santa Catarina (FAMESC) foi aprovada resolução que se posiciona contra as Organizações Sociais.
Sintespe: Qual a orientação e decisão das instâncias da FAMESC na defesa dos serviços Públicos?
Allan Rodrigo Alcântara: Nossa luta então passa ser, de inicio, o imediato acatamento por parte do Governo do Estado de Santa Catarina a decisão da Ação Civil Pública n.º 5772-2005-035-12-00-2, ou seja, o fim dos contratos existentes com as OS’s. Mas não se encerra nesta questão pontual. Defendemos a revogação da Lei Federal 9.637/98, e por conseqüência das Leis Estaduais e Municipais baseadas na legislação maior.
Estamos enquanto direção da FAMESC, orientando todas as entidades comunitárias para que se organizem em prol desta bandeira de luta. Nossa intenção é construir um Fórum Popular Catarinense em Defesa do Serviço Público de Qualidade com Administração Direta do Estado e Controle Social.
Desejamos que este Fórum tenha a força de colocar Santa Catarina na rota do desenvolvimento que o Brasil já experimentou e aprovou, com um Estado forte, que esteja centrado na resolução direta e imediata das urgências da sociedade.
Sintespe: Há inúmeras denuncias de desvios de recursos por parte de OSs em várias estados do Brasil, com prejuízo direto para a população. Qual é a sua opinião sobre a falta de fiscalização por parte do Estado em relação a gestão privada das OSs?
Além de revogar este retrocesso, construído com a instituição das OS’s, é imprescindível que se faça uma verdadeira auditoria nos contratos que existiram, para responsabilizar os governantes e administradores privados por eventuais prejuízos que a população possa ter ao longo de suas vigências.
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