Raquel Júnia
Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV), Fiocruz
Adital
[Raquel
Júnia - Enviada Especial ao III Seminário da Frente Nacional Contra
Privatização da Saúde]
Frente
Nacional já reúne 15 fóruns estaduais e onze municipais atuando contra formas
de desmantelamento do SUS, como a transferência da gestão para as Organizações
Sociais (OS), a precarização dos serviços e dos trabalhadores da saúde, e a
Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH).
A primeira mesa do III Seminário da Frente Nacional contra a
Privatização da Saúde foi composta por representantes dos fóruns de Saúde do
Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná e Alagoas, além de uma representante da própria
frente, que abordaram a história e atuais desafios dessas organizações. O III
Seminário foi realizado de 7 a 9 de junho na Universidade Federal de Alagoas
(UFAl), em Maceió. Além dos quatros fóruns presentes na mesa, que foram
pioneiros nessa organização, a Frente já conta com movimentos organizados em
mais onze estados - Santa Catarina, Paraíba, Minas Gerais, Rio Grande do Sul,
Rio Grande do Norte, Pernambuco, Ceará, Maranhão, Goiás, Pará, Mato Grosso - e
no Distrito Federal.
Fórum
Popular de Saúde do Paraná
O Fórum
Popular de Saúde do Paraná existe desde a década de 90. Surgiu como um espaço
de defesa e acompanhamento da recém iniciada Reforma Sanitária. Atualmente, o
Fórum passa por um processo de reestruturação que está incorporando militantes
mais jovens. Manuela Lorenzi, militante do Fórum, citou alguns dos desafios
identificados pelo grupo. "Precisamos deixar de ser reativos. O poder
público vem com a proposta de OS aí nos organizamos, produzimos jornais,
ocupamos a assembleia. Depois, com a proposta da EBSERH novamente nos
aglutinamos, fazemos jornais e nos mobilizamos. Precisamos nos organizar para
além da reação ao que os gestores apontam como política", disse.
De acordo
com Manuela, outros desafios identificados são pensar um projeto de saúde pública
para além das pautas dos sindicatos e organizações que compõem o Fórum e dar
mais visibilidade ao coletivo. Além disso, pensar em como enfrentar a
fragmentação da esquerda. "Nosso inimigo é muito maior do que isso e está
unido", lembra Manuela.
Fórum
Popular de Saúde do Estado de São Paulo
Em uma
conjuntura de intensa privatização dos serviços de saúde, que ocorre em um
ritmo mais acelerado do que no restante do país é que atua o Fórum Popular de
Saúde do Estado de São Paulo. Segundo o representante do Fórum, Felipe Cardoso,
já são 40 hospitais entregues às Organizações Sociais (OS) no estado. Felipe
citou também a situação do município de São Bernardo do Campo onde o governo
municipal está implementando a polêmica proposta de Fundação Estatal de Direito
Privado. "E quando vamos olhar o conselho diretor da Fundação estão lá as
mesmas OS que privatizam o SUS em São Paulo", denunciou.
Felipe
mencionou também as diversas ações do Fórum nos últimos meses como a
mobilização para impedir a entrega do Caism Água Funda, para uma OS, que tem
sido vitoriosa, e, da mesma forma, barrar a entrega do Centro de Atenção
Psicossocial (Caps) de Vila Brasilândia à administração privada. "Todos
nós lutadores do SUS acreditamos que nada deve ser impossível de mudar",
salientou. O Fórum Popular de Saúde de São Paulo foi criado em 2009.
Fórum de
Saúde do Rio de Janeiro
Assim como
em outros estados, o Fórum de Saúde do Rio de Janeiro protagonizou mobilizações
contra a entrega da gestão dos serviços públicos para as Organizações Sociais.
Juliana Bravo, representante do Fórum, contou que durante a votação do projeto
de lei estadual que permite a transferência da gestão dos serviços de saúde
para as OS, houve repressão aos manifestantes que protestavam do lado de fora
da Assembleia Legislativa, que foram impedidos de acompanhar a votação.
"O
Fórum foi criado em 2005 face à crise da saúde no Rio de Janeiro, quando os
hospitais sofreram intervenção do governo federal", contou Juliana. Ela
explicou que o movimento foi criado inicialmente como Fórum em Defesa do
Serviço Público e contra as Fundações. Já em 2008, o fórum junta forças com
outro servidores públicos na criação do Movimento Unificado dos Servidores
Públicos Estaduais (Muspe). Pouco tempo depois, em 2009, o grupo é recriado já
com o nome que tem hoje - Fórum de Saúde do Rio de Janeiro. "Identificamos
como desafios a descentralização e criação de núcleos em outros municípios do
estado do Rio, além disso, a necessidade de mobilizarmos mais sindicatos e
movimentos sociais, disputarmos a hegemonia nos conselhos de saúde e também
organizarmos nossa participação na Cúpula dos Povos", enumerou. Juliano
relatou ainda que o Fórum realizou recentemente uma oficina de planejamento
estratégico.
Fórum em
Defesa do SUS e contra a Privatização de Alagoas
Maria
Valéria Correia, representante do Fórum em Defesa do SUS e contra a
Privatização de Alagoas, relatou que no estado alagoano a organização do grupo
começou em 2008, a partir do anúncio da criação das Fundações Estatais de
Direito Privado no Estado. Na ocasião, o grupo de pesquisa em Políticas
Públicas, Controle Social e Movimentos Sociais da Faculdade de Serviço Social
da Universidade Federal de Alagoas realizou um seminário do qual um dos
resultados foi um manifesto contra as fundações. Posteriormente, assim como o
do Rio de Janeiro, o Fórum de Alagoas também muda de nome. "Decidimos por
chamá-lo de Fórum em defesa do SUS e contra a privatização porque assim o nome
dá conta de tudo o que vier de modelo privatizante", contou Maria Valéria.
Dentro do
histórico de mobilizações do Fórum, Maria Valéria lembrou que assistentes
sociais procuraram o grupo para fazer uma denuncia da desassistência do poder
público à 14 crianças cardiopatas que necessitavam de tratamento. Alagoas não
dispunha da estrutura adequada para tratamento do problema. Segundo a
professora, das 14 crianças, oito morreram na fila de espera para o tratamento.
"A partir dessa denuncia fomos ao Conselho Estadual de Saúde, denunciamos
para a imprensa também. Os pais das crianças que estavam na fila de espera
também se envolveram na luta", relatou. Segundo a professora, na ocasião,
um hospital privado ofereceu implementar o serviço e receber recursos públicos
em troca de um leito para o SUS. O movimento criticou: "No Hospital Universitário
há 86 leitos e cinco salas de cirurgia desativadas. Temos que aproveitar essa
estrutura. Não queremos dinheiro público no setor privado".Outra ação que
se intensificou recentemente, de acordo com Maria Valéria, foi a mobilização
contra a EBSERH. "A EBSERH ainda não está na pauta do Conselho
Universitário [da UFAL], mas sabemos que entrará em breve e temos ido para lá
em massa desde já, elegemos seis conselheiros do nosso lado. Dizemos que
estamos fazendo um trabalho preventivo contra a privatização", reforçou.
Frente
Nacional
"A Frente resgata a reforma sanitária e seus princípios originais -
saúde, democracia e socialismo", afirmou Maria Inês Bravo, representante
da Frente na primeira mesa do seminário. O movimento surgiu em 2010, a
princípio com a participação dos fóruns de Alagoas, Rio de Janeiro, São Paulo e
Paraná no bojo da mobilização contra as Organizações Sociais. De acordo com
Maria Inês, a Frente foi se constituindo como um espaço "de esquerda,
anticapitalista e para a emancipação humana na perspectiva concreta de avanços
nos direitos".
A professora
apontou como desafios retomar a luta pelo julgamento procedente da Ação Direta
de Inconstitucionalidade sobre as Organizações Sociais (Adin 1923/1998), bem
como ampliar o número de assinaturas de entidades na carta pela aprovação da
Adin e no abaixo-assinado, cuja meta é atingir 10 mil assinaturas, e hoje já
conta com mais de sete mil. Além disso, mapear e acompanhar a discussão sobre a
EBSERH nos conselhos universitários.
Maria Inês
destacou também as ações da Frente nas ultimas mobilizações como a dos
servidores públicos federais e na 14ª Conferência Nacional de Saúde. "Nós
éramos o único grupo organizado lá, incomodamos bastante. Saímos vitoriosos da
Conferência, por isso a carta imposta pelo Ministro da Saúde acabou caindo no
vazio, por conta das nossas ações", avaliou. Para a Frente, um outro
grande desafio é cavar espaço nas mídias comerciais. Segundo a professora, a
Frente já tem conseguido articular os meios de comunicação das entidades que
participam do Fórum, falta agora, conseguir mais visibilidade na mídia em
geral.
Frente única
operária, bloco histórico e revolução permanente são conceitos marxistas que,
de acordo com Maria Inês, devem permear a atuação da Frente. A professora
ressaltou também que o movimento precisa avançar em longo prazo para uma
proposta de articulação contra todos os tipos de privatização nas políticas
públicas. "Precisamos avançar nesse processo dentro da perspectiva da
reforma sanitária, começando pela saúde e ampliando para outras áreas".
Maria Inês
finalizou com mais desafios para a Frente: pensar a recomposição da esquerda no
Brasil e articular a luta contra a privatização da saúde no país com as lutas
na América Latina e no mundo. A professora citou como avanço nessa articulação
internacional os contatos já estabelecidos com a Argentina e a Europa.
Expressão disso foi a presença no seminário do militante francês, Julien
Terrié, da Rede Europeia para o Direito à Saúde. O pesquisador Argentino
Horacio Barri, do Movimento por um Sistema Integral de Saúde na Argentina e da
Associação Latino-Americana de Medicina Social (Alames) não pode participar,
mas enviou uma carta de saudação aos participantes do seminário. A professora
acentuou também a necessidade de fortalecer dentro da Frente o movimento de
mulheres para avançar em debates como a descriminalização do aborto.
Confira os
vídeos de todas as mesas do seminário no site da Frente Nacional Contra a
Privatização da Saúde.
Leia mais: Especial
Público e Privado na Saúde
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